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quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A um poeta - Olavo Bilac


Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino, escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre e sua!

Mas que na forma se disfarce o emprego
Do esforço; e a trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua,
Rica mas sóbria, como um templo grego.

Não se mostre na fábrica o suplício
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifício.

Porque a Beleza, gêmea da Verdade,
Arte pura, inimiga do artifício,
É a força e a graça na simplicidade.

Vocabulário
Andaime: armação.
Claustro: clausura, recinto fechado.
Estéril: improdutivo.
Sóbria: simples, moderada.
Trama: teia, enredo, urdidura.
Turbilhão: agitação.

O Parnasianismo se define pelo ´´culto da forma`` e foi sobretudo uma renovação poética. Esta renovação tem suas origens na França. Em 1866, foi editada uma antologia, Le Parnasse contemporain, que reunia composições de poetas de diversas tendências, entretanto com uma linha comum: reagir contra o Romantismo. O Parnasianismo está relacionado à palavra Parnassus, monte da Fócida, na Grécia. Segundo a lenda, lá residiam os poetas. Por extensão, designa também uma espécie de morada simbólica dos poetas.

Os parnasianos seguiam como mestres Leconte de Lisle e Théophile Gautier. Coube a este último codificar a teoria parnasiana da ´´arte pela arte``: recusa de conteúdo social, moralizador; indiferença à noção do progresso social; abandono de qualquer missão educativa ou da função de eco das preocupações do seu tempo. O objetivo da ´´arte pela arte`` é o Belo, a criação da beleza pelo uso perfeito dos recursos artísticos. Neste sentido, levaram ao exagero o culto do ritmo, da rima e do vocabulário.

No Brasil, considera-se que o primeiro livro parnasiano, no sentido próprio, teria sido Fanfarras (1882), de Teófilo Dias. A partir de 1883, este movimento se define, na Literatura Brasileira, sobretudo com os versos de Alberto de Oliveira, Raimundo Correia e Olavo Bilac.

Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac nasceu no Rio de Janeiro, em 1865. Cursou Medicina até o 4.º ano e, posteriormente, passou a frequentar a Faculdade de Direito em São Paulo. Dedicou-se ao ensino, foi jornalista e funcionário público. Faleceu na sua cidade natal, em 1918. É um dos poetas mais lidos da Língua Portuguesa, não somente pela qualidade de sua poesia, como também pela grande popularidade de que passou a gozar, quando se envolveu com a divulgação de valores nacionalistas.

Seu primeiro livro, Poesias, foi publicado em 1888 e teve uma ´´edição definitiva``, em 1902. Em 1919, um ano após sua morte, apareceram os sonetos de Tarde. Seus versos primam pela perfeição formal, embora sua poesia seja superficial como visão do mundo e do homem. São antológicos poemas como ´´O caçador de esmeraldas``, ´´Via láctea``, ´´Sarças de fogo``. Além disso, deve-se assinalar que Olavo Bilac foi o autor da letra do ´´Hino à Bandeira``.

A escolha do soneto (uma composição de catorze versos, distribuídos em dois quartetos e dois tercetos) torna evidente a preocupação do poeta com a forma, o que aparece também no apuro da construção dos versos e no emprego da rima rica, seguindo a teoria clássica de versificação (tal composição havia sido relegada a segundo plano pelos românticos). A contenção das emoções é defendida no poema: o objetivo do poeta deve ser provocar o sentimento do Belo, sem deixar transparecer seus sentimentos pessoais ou as inquietações da sociedade. Esses aspectos se opõem ao subjetivismo e à liberdade de expressão do Romantismo. Revelam uma nova maneira de fazer poesia, que caracteriza o estilo denominado Parnasianismo.

Comentários sobre o poema

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´´A um poeta`` é um soneto muito especial, pois se trata de um poema metalingüístico, ou seja, é um poema sobre o próprio ato de escrever poemas, segundo a estética parnasiana. Formalmente, temos um soneto decassílabo (dez sílabas poéticas), com rimas ricas (esquema abba/baab/cdc/dcd). Chama-se rima rica aquela que se faz entre palavras de classes gramaticais diferentes: rua (subst.) / sua (pronome), construa (verbo) / nua (adjetivo), emprego (subst.) / grego (adjetivo) etc.

Quanto ao tema, Bilac (que foi chamado o príncipe dos poetas) exalta o trabalho do poeta parnasiano, que procura, exaustivamente, a perfeição formal com paciência, no aconchego de um lugar sossegado e solitário. O ideal clássico de arte aparece expresso nos objetivos que pretendem ser alcançados: a Beleza, gêmea da Verdade, Arte pura; a perfeição e a sobriedade de um templo grego. O poeta parnasiano é um perfeccionista. Escolhe cuidadosamente o vocabulário para expressar com precisão e realismo as ideias que se desenvolvem do tema abordado.

Na primeira estrofe, ´´beneditino`` e ´´claustro`` associam o trabalho do Poeta ao sacerdócio. O eu lírico faz uma comparação: assim como o monge beneditino, por tradição, paciente e constante, trabalha retirado do mundo, assim também o Poeta parnasiano, ´´longe do estéril turbilhão da rua``, vai concebendo e burilando seus versos, para conseguir a perfeição da forma. O quarto verso (de extraordinária riqueza estilística) destaca a elaboração do trabalho poético. A repetição intencional do conectivo ´´e`` entre os verbos chama-se polissíndeto. Essa repetição reforça a ideia de um trabalho contínuo, árduo.

Os cinco verbos traduzem o labor do artífice que, persistente, procura a perfeição. Em outras palavras, poderíamos defini-los da seguinte forma: ´´Trabalha (escrever não é apenas lazer), e teima (a busca da expressão perfeita exige paciência e dedicação), e lima (o verso precioso, deve ser cuidadosamente lapidado), e sofre (a busca da expressão perfeita é, às vezes, angustiante), e sua (o trabalho do poeta também é desgastante)``. É possível perceber uma grande diferença da visão romântica, que acreditava na espontaneidade da criação literária.

Na segunda estrofe, o eu lírico propõe que a forma e a trama sejam trabalhadas a tal ponto que a imagem adquira algumas características abstratas: nudez, riqueza e sobriedade. O poema, depois de pronto, deve se impor naturalmente, sem deixar transparecer o esforço do Poeta. Repare que o ´´templo grego`` (formas simples e imponentes) deve ser o referencial de perfeição. Este referencial remete a uma característica do parnasianismo: retorno aos motivos clássicos. Os vocábulos, adequadamente escolhidos, dão-nos a real dimensão da edificação de um templo (o templo da Arte), majestoso, rico e de formas perfeitas, como foi a arquitetura grega.

A ideia de esforço, que aparece na estrofe anterior, é retomada agora em uma outra palavra, que se refere ao grau mais intenso do sofrimento: suplício. Percebemos, logo no início da terceira estrofe, o emprego de uma metáfora: ´´Não se mostre na fábrica o suplício/Do mestre. `` Estes versos indicam que o poema (´´suplício do mestre``) não deve mostrar todo o trabalho de elaboração do poeta. O que importa, verdadeiramente, é a obra concluída, real e sublime à apreciação, sem que se exponham os obstáculos, as dores, a tristeza por que tenha passado o autor (sua beleza deve parecer natural). É a oposição aos ditames do Romantismo.

A última estrofe representa a chave de ouro do soneto. Nela está a conclusão das ideias apresentadas ao longo do poema: com Beleza (gêmea da Verdade) e Arte pura sem artifícios (aquilo que é artificial, não natural, postiço, fingido) a obra do artista, na simplicidade, tem força e graça. Há uma certa contradição, se considerarmos que esta ´´simplicidade`` é, na verdade, fruto de uma elaboração extrema e existem, no poema, vários artifícios poéticos como a metrificação, a rima etc. No entanto, segundo o eu lírico, tudo isso não deve chamar a atenção do leitor, para quem a Beleza deve surgir naturalmente.

domingo, 14 de novembro de 2010

Amor é um fogo que arde sem se ver - Camões


Amor é um fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Vocabulário
Desatina: enlouquece.
Cuidar: julgar.
Lealdade: sinceridade, franqueza, honestidade.
Favor: agrado, simpatia, mercê, graça.


Camões nasceu provavelmente em Lisboa, em 1524 ou 1525, de uma família de pequena nobreza decaída e pobre. Teve uma educação escolar esmerada, circulou nos ambientes aristocráticos e, ao mesmo tempo, frequentou a desregrada boêmia lisboeta. Preferiu a carreira das armas à das leis; combateu em Marrocos, onde perdeu um olho. Esteve preso por brigas e foi obrigado a embarcar para a Índia, em 1553. Sua estada no Oriente foi tumultuada e cheia de problemas financeiros; de volta a Portugal, em 1569, trazia na bagagem Os Lusíadas, que foi publicado em 1572. Morreu na miséria, em 1580. Além de Os Lusíadas, escreveu muitos sonetos, vilancetes, cantigas, trovas e esparsas; no gênero dramático, produziu três comédias: Anfitriões, El-Rei Seleuco e Filodemo.

Como poeta lírico, Camões também exprime a época em que viveu, um período de profundas transformações. Por isso, seus poemas variam de tom e de assunto, assim como variam de forma: escreve textos breves, espontâneos, soltos, com raízes na tradição popular (as redondilhas – medida velha), ou outros, mais elaborados e engenhosos, nascidos da cultura palaciana do seu tempo, como o soneto (a medida nova).

Este soneto (composição poética de forma fixa) lembra uma célebre crítica que Platão fazia ao ´´rio`` mutante de Heráclito: se uma coisa está sempre mudando, nós não podemos conhecê-la. Tal como o rio de Heráclito, que, por não ter estabilidade e não ser igual a si mesmo, impossibilita o conhecimento, o amor, sendo tão contrário a si, tão complicado, não deveria ser tão imprescindível aos corações humanos.

Comentários sobre o poema
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Podemos dividi-lo em dois planos, o primeiro, que descreve os efeitos paradoxais do amor no ser humano (três primeiras estrofes), e o segundo (última estrofe), que estabelece perplexidade da pergunta que funciona como conclusão do texto (chave de ouro).

Esse ´´Amor ``de que se fala não é individual, mas universal (observe o uso da letra maiúscula nesse substantivo comum). O poeta usa incansavelmente o verbo ser procurando definir os paradoxos, as contradições que caracterizam esse sentimento, através de uma cadeia anafórica: Amor é fogo, é ferida, é um contentamento, é dor, é um não querer, é solitário, é nunca contentar-se, é um cuidar que se ganha, é querer estar preso, é servir a quem vence, é ter lealdade...

Se por um lado há um esforço de racionalizar, de definir, de explicar, por outro há uma sucessão tão grande quanto esse esforço de falta de lógica, falta de nexo: como o amor pode ser fogo que arde (redundância) e ao mesmo tempo não se vê, ferida que dói (redundância) e ao mesmo tempo não se sente, enfim, como o amor pode ser um contentamento descontente? Observe que, além da linguagem de opostos, há um outro elemento que aumenta os jogos de significados: o texto começa e termina com a palavra Amor, o que sugere que qualquer tentativa de análise do sentimento amoroso conduz sempre ao ponto de partida.

A essência do poema caracteriza-se por uma preocupação constante de racionalizar o que vai além da razão, de explicar o que está além da explicação, de universalizar o que pertence ao coração... Note que a interrogação com que o poema termina é argumentativa, ou seja, mantém o tom polêmico presente em todo o texto, não abre mão de provar racionalmente a irracionalidade do sentimento amoroso.

Quanto à métrica, este soneto filosófico apresenta versos decassílabos (predomínio dos heróicos, nos quais a sexta e a décima sílabas são sempre tônicas), dividido em quatro estrofes, com rimas opostas nos dois quartetos (abba) e rimas alternadas nos dois tercetos (cdc dcd). Cada uma das três primeiras estrofes compreende uma região afetiva particular: o primeiro quarteto fixa-se principalmente nos efeitos corporais da paixão, que exprime sensibilidade e insensibilidade à dor (amor é sofrimento).
Nestes versos, percebe-se que o eu lírico constrói metaforicamente o sentido do Amor-ideia, amor universal, filosofando a respeito do amor, não falando de seus sentimentos pessoais. Para isso, ele se apropria de elementos que, apesar de se excluírem mutuamente, se fundem num mesmo referente, constituindo afirmações aparentemente sem lógica (paradoxos).

O segundo quarteto exprime a dimensão ´´romântica`` e subjetiva do apaixonado e uma espécie de serena autoentrega aos caprichos do amor (amor é desprendimento). O eu lírico parece comprazer-se com o paradoxo, enfeixando sensações contraditórias do sentimento humano, se examinadas sob o prisma da razão. Repete-se, por várias vezes, a forma verbal, com a função de ligar um predicativo a um sujeito (o amor é sempre o sujeito).

O primeiro terceto procura pôr em relevo o drama moral do apaixonado, de acordo com uma dinâmica em que ele vem a optar por aquilo que mais o escraviza: a prisão, a submissão e a morte (amor é doação). É a relação (subentendida) entre duas pessoas. É importante ressaltar que, ao longo do poema, percebemos uma fragmentação de sensações (ver, doer etc.) e de sentimentos relacionados ao amor (um todo é desmembrado em suas partes, para ser conhecido, propondo uma série de afirmações contraditórias).

No último terceto, o poeta substitui o ´´e`` implícito em todas as outras estrofes( indicador de continuidade), por um ´´mas``(conjunção adversativa), indicador de ruptura. Surge, aí, um eu lírico perplexo, que nos mostra, talvez, a maior contradição de todas as que enumerou (amor é paradoxo). Se o amor é tão contrário, a si, tão paradoxal e movediço, como causa amizade nos corações humanos? Como estes corações não conseguem dispensar o seu ´´favor`´, a sua presença? Como as pessoas podem gostar de uma coisa tão contrária a si mesma como o amor? Só quem ama ou amou pode responder, ou juntar suas indagações...